Máscaras são tradicionais em Porto de Pedras
Thiago Souza
Há quem ache que a tradição de utilizar máscaras em Alagoas se resume aos eventos carnavalescos. Em Porto de Pedras, porém, a tradição se mantém viva e inspira os jovens em todas as épocas do ano. A confecção do acessório vai além da mistura do barro com a papietagem, mas transforma-se em um símbolo de resistência contra o esquecimento da tradição local.
Mestre Gilberto, que recebeu o título de Patrimônio Vivo de Alagoas, e o artesão Thiago Silva tornaram-se âncoras de um legado passado de geração em geração, que hoje permeia o imaginário cultural de crianças e adolescentes.
O g1 AL coloca a sua máscara cheia de cores e vida e se aventura no modo confecção e no que representa o legado desses artesãos, conhecidos como mascareiros.
Confecção das máscaras
Ruas de Porto de Pedras são tomadas por desfiles de máscaras
Thiago Souza
Uma das características mais marcantes das máscaras dos bobos é a sua variedade de formatos, onde cada mascareiro traz a sua autenticidade e criatividade através da produção da peça. Entre as principais referências, os animais e as figuras humanoides são destaques na confecção.
Segundo Thiago Souza, integrante do Bobo Gaiato e também mascareiro, o processo de criação das máscaras é minucioso e repleto de significados. As cores, a modelagem e o peso emocional que cada peça carrega dão identidade ao acessório tradicional.
Máscaras Porto de Pedras
Thiago Souza
Durante o processo, o barro é peneirado, hidratado e levado para secagem sob a luz do sol. Quando seco, camadas de papel e cola são implantadas e a máscara é novamente levada. Dependendo do clima, o acessório pode demorar dias para ser finalizado.
“Após o processo de secagem, desenformamos e fazemos o acabamento nas bordas e outros detalhes como olhos e boca”, conta.
Thiago lembra que sua primeira máscara confeccionada foi feita com papel no quintal da casa de um amigo. Apesar de não ter sido a sua melhor peça, o artesão ressaltou que manteve características do material utilizado.
Além do preparo, ele destacou que as cores também são fundamentais para a variedade das máscaras, normalmente utilizando cores vivas como vermelho, amarelo e verde.
“Quando escolho as cores, penso sempre na energia que a máscara deve transmitir no momento da brincadeira, e é importante ter muitas cores, que também acompanha uma diversidade de máscaras”, conta Thiago.
Legado de Mestre Gilberto
Através do barro, nascia um artesão e mascareiro que traria saberes para a população de Porto de Pedras. Aos 12 anos, Mestre Gilberto começou a confeccionar suas primeiras máscaras no interior de Alagoas e, ao longo das décadas, lutou contra o esquecimento da tradição com a aprendizagem de jovens alagoanos. Um deles, Thiago Souza.
Na fase adulta, Thiago foi uma das pessoas que viveu seus últimos anos ressaltando a importância da cultura mascareira no Litoral Norte do Estado. Não apenas na criação de novas peças, mas também atravessando o audiovisual e projetos sociais.
“A máscara que mais me marcou foi feita para o filme Reino dos Bobos, em que fazia referência de outras peças feitas pelo Mestre Gilberto. Ela foi utilizada pelo protagonista do filme, um personagem feito por mim, chamado de ‘Bobotoqueiro’, que saiu de moto em uma jornada por Alagoas em busca de outras máscaras do estado.” disse.
O artesão conta como as técnicas do Mestre Gilberto influenciaram no processo de aprendizagem.
“O Mestre Gilberto foi a grande referência cultural da minha vida. O conheci de modo mais profundo já adulto, no processo de criação do Bobo Gaiato. Eu tive a oportunidade de ouvir dele com detalhes como se fazia, Seu Gilberto me mostrou que o artesanato popular pode ser passado, presente e futuro”, conta.
Atualmente, sua luta é dar visibilidade às práticas culturais das máscaras em festivais, exposições educativas e oficinas para crianças e adolescentes. Seu objetivo é, da mesma forma que seu mestre, manter a tradição da cidade viva na memória dos que a preservam hoje e dos que ainda irão nascer.
1° Festa do Bobo, projeto social e incentivo aos jovens
Mascaras porto de pedras
Thiago Souza
Dentre seus objetivos, Thiago Souza lidera o projeto social Bobo Gaiato, que auxilia na integração de crianças e adolescentes na cultura tradicional de Porto de Pedras. Além disso, ele se tornou superintendente da Juventude do Estado de Alagoas.
Thiago fala sobre os principais desafios de integrar e aproximar os jovens nas tradições regionais do estado.
“O mundo digital ainda atrai muito os jovens e, muitas vezes, a cultura popular não tem o mesmo espaço. Mas quando eles participam de oficinas, experimentam a confecção e entendem o valor das máscaras, se encantam. O desafio é criar essa aproximação inicial, mostrar que essa tradição não é só do passado, mas que pode ser deles também. Isso tem acontecido,” fala.
O artesão conta que jovens aprendizes como Victor e Erick cultuam o compartilhamento de saberes entre outros adolescentes da região, sendo peças fundamentais para a revitalização da cultura tradicional do Litoral Norte de Alagoas.
“Eles [Victor e Erick] além de aprender, também multiplicam o conhecimento. Isso é fundamental para que a tradição não pare em uma só pessoa, mas se torne coletiva”, relata.
Já a Festa do Bobo foi realizada durante três dias, onde sua missão era enfatizar a integração cultural de crianças e adolescentes. Além disso, a festividade contou com muita música, exposições e uma oficinas que ensinavam a montar a sua primeira máscara.
Dentre as atividades, a exposição Gilberto Vai Ficar! foi destaque na programação. Nela, as máscaras produzidas pelo mestre entre os anos 90 e entregues ao fotógrafo Celso Brandão foram expostas em um momento de emoção, tradição e luta.
São Paulo Fashion Week
E o artesanato alagoano sai das ruas de Porto de Pedras e viaja para direto para as passarelas de São Paulo! A marca FOZ, do estilista Antônio Castro, contratou Thiago e sua equipe para encomendar chapéus coma máscaras tridimensionais.
De acordo com o artesão, as máscaras tridimensionais serão coladas no chapéus com as mesmas técnicas utilizadas nas peças tradicionais. Além disso, ele afirma que está tentando custear passagens aéreas para três jovens do projeto Bobo Gaiato.
“A gente tá finalizando as peças e vai ser bem interessante, porque eles [jovens] nunca saíram daqui. Vai ser uma oportunidade de ir pra São Paulo Fashion Week, trazer visibilidade a nós, a nossa obra lá no evento”, contou.
Os bobos: diferenças da capital e interior
Nas ruas de Maceió, ainda há aqueles que saem vestidos de roupas trapeadas em cores variadas para brincar com a população. Contudo, as cidades possuem grandes diferenças entre os bobos da capital e os de Porto de Pedras, interior de Alagoas.
O processo de construção das máscaras é a principal aversão entre as cidades. Enquanto em Porto de Pedras as peças são feitas de barro e papel, na capital alagoana o acessório é confeccionado com tecido.
Mesmo assim, ainda tem suas semelhanças, ambas as cidades cultuam as práticas através de cortejos que passam nas ruas. Em Maceió possui o Bloco do Bobo, realizado desde 2001 na Vila Brejal e Bom Parto. O evento conta com oficinas para produção das máscaras durante o carnaval da capital alagoana.
Grupo usa fantasias de bobo para pedir dinheiro em semáforo de Maceió
Em Porto de Pedras, os bobos fazem a festa em eventos carnavalescos locais no interior. Nas ruas, eles dançam, pulam e brincam com as vizinhanças enquanto a batida dos trompetes e tambores ecoam nas passagens.
Por: G1 Alagoas